Religiosa está no Rio para participar de ciclo de palestras, no Midrash Centro Cultural, que será realizado na próxima semana
“Eu
nasci nos EUA em 1951 e visitei Israel pela primeira vez aos 20 anos.
Durante quatro décadas, busquei na religião uma solução para a
minha confusão de identidade de gênero. Essa jornada foi contada em
livro. Iniciei a transição aos 50, e, hoje, vivo em Jerusalém
dando aulas de judaísmo e mentoria espiritual”
Conte algo que não
sei.
A transição salvou a minha
vida. Eu não era suicida, mas cheguei a um estágio em que percebi
que não podia continuar. Eu sentia que estava morrendo.
O seu livro narra a
sua jornada pessoal?
Isso. Ele conta a minha
trajetória entre 1971 e 2011. Começa com a minha primeira visita a
Israel, quando conheci o Muro das Lamentações, com 20 anos de
idade. Lá, existe um divisor entre homens e mulheres. Eu já sabia,
desde a infância, que era transgênero, uma menina que tinha o corpo
de menino, e, naquele momento, eu tive que escolher um lado a seguir.
Eu sabia o que deveria ter feito, mas ir com as mulheres causaria
problemas. Então, fui com os homens, e criei problemas dentro de
mim. Aos 60 anos, eu fui ao Muro das Lamentações pela primeira vez
como Yiscah, como mulher. Foram 40 anos na minha caminhada pelo
deserto, um paralelo com a história do Êxodo, na Bíblia. Os
hebreus passaram 40 anos vagando pelo deserto até chegarem a Israel.
Eles saíram, como eu, da escravidão para a liberdade.
Mas, antes da
transição, você foi casada, não é?
Sim, entre 1973 e 1991, e
tive seis filhos. Digo, tenho seis filhos e os amo. Eu os amo por
serem meus filhos, não tem nada a ver com eu ser homem ou mulher,
não tem relação com gênero.
E como é a sua
relação com a família?
Eu tenho meus pais, minhas
irmãs, meus filhos e minha ex-mulher. É uma mistura, eu não falo
muito sobre a minha família. Eu a respeito. Eu sempre fui próximo
da minha mãe, mas estou ainda mais agora, porque ela vê algo que
ninguém mais consegue: uma paz, que nunca tinha visto antes.
Você sabia ser
transgênero desde a infância. Por que esperou tanto até a
transição?
Pessoas como eu, hoje em
dia, com 15, 10 anos, podem dizer aos pais: eu sou uma menina, não
um menino. Quando tinha essa idade, eu nem sabia que isso existia. Eu
achava que era a única pessoa desse jeito no mundo. Vivi muitos anos
com esse medo. Até 1992, depois de ler artigos e descobrir que não
era a única. Em 2001, eu decidi pela transição, que levou alguns
anos.
E como é a sua
relação com a religião?
Não existe nada no Tanakh
sobre os transgêneros. Não existe uma palavra em hebreu, nenhuma
citação. O que é mencionado é que homens não devem usar roupas
de mulheres e vice-versa. E existe uma coisa muito importante no
judaísmo, que veio das tradições, não está na Bíblia: salvar
uma vida é mais importante que os outros mandamentos. Por exemplo,
no sabá, as pessoas não podem dirigir, mas se for para levar alguém
ao hospital, podem. Eu salvei a minha vida.
Mas você sofre
algum tipo de preconceito?
Eu posso dizer que a maioria
das pessoas religiosas que eu conheço tem a mente aberta, mas
existem alguns com ela fechada. Mas isso não tem a ver com a
religião, mas com o que elas pensam. Não está nos livros.
E você sempre foi
religiosa?
Não, eu me tornei religiosa
a partir da visita a Israel. Eu pensava que Deus levaria a minha
angústia, mas, como nunca era atendida, fui me tornando cada vez
mais ortodoxa. Tinha barba longa e usava chapéu preto. Eu achava que
a religião iria me “curar”. Mas Deus não faz mágica, o que Ele
faz é criar os médicos, que possuem o conhecimento. Foi dessa forma
que Deus me “curou”.
Fonte:http://oglobo.globo.com/
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