Uma
onda de protestos nos Estados
Unidos provocou
na semana passada a retificação de duas leis que ameaçavam o
avanço dos direitos homossexuais
em
nome da liberdade religiosa. As manifestações, boicotes e
pronunciamentos das maiores empresas do país, quase de forma
uníssona, conseguiram que os Estados de Indiana e Arkansas dessem um
passo atrás para evitar que as leis fossem utilizadas para
discriminar os gays. Mas as legislações jogaram luz sobre a
tentativa do setor mais conservador da sociedade norte-americana de
impedir a consolidação de direitos que muitos já consideram
inevitáveis.
O
cabo de guerra disputado nos últimos dias por conservadores e a
comunidade homossexual é o mesmo que foi travado nas primeiras
regulamentações do direito ao aborto ou do acesso aos
contraceptivos. A sociedade norte-americana, impulsionada por uma
mudança demográfica que forma uma nação mais diversa e mais
progressista, apoia amplamente o direito à igualdade dos
homossexuais. No outro extremo, a liberdade religiosa se converte no
último recurso legal dos conservadores contra esse avanço.
Os
principais líderes republicanos defenderam a lei de Indiana, copiada
depois por Arkansas. O republicano Jeb Bush, ex-governador da Flórida
e provável pré-candidato à Casa Branca, afirmou que Indiana fez “o
correto” e que a lei “não é discriminatória”. Seu
companheiro de partido e pré-candidato à Presidência em 2016 Ted
Cruz comemorou que a lei tenha dado voz “a milhões de bravos
conservadores”.
A estratégia
republicana é uma resposta aos últimos avanços dos direitos dos
homossexuais, de acordo com Sally Steenland, do Center for American
Progress. A Suprema Corte vai
estudar nesse semestre se os homossexuais têm direito a se casar.
Seis de cada 10 eleitores apoiam o casamento entre pessoas do mesmo
sexo, e sete de cada 10 moram em um dos 37 Estados onde o matrimônio
homossexual é reconhecido. Para 72%, o casamento igualitário é
inevitável, segundo dados do Centro Pew. Os números motivaram uma
manchete do jornal conservador The
Indianapolis Star essa
semana. Eram três palavras em branco sobre o preto para cobrar dos
parlamentares a mudança da lei: “Corrijam isso já”.
Os
republicanos se amparam em uma lei sancionada por Bill Clinton em
1993, mas o país mudou profundamente desde então. Dezenas de
organizações civis reagiram contra Indiana, assim como as grandes
empresas como Apple,
Walmart,
General Eletric e Yelp e governadores democratas que anunciaram
boicotes contra Indiana.
Os
Estados Unidos buscam o limite em que a liberdade religiosa e os
direitos das minorias possam conviver. Os assuntos sociais separam os
republicanos dos democratas, ainda que, no caso de Indiana, os
conservadores tenham um conflito interno, obrigados a satisfazer os
eleitores mais velhos sem comprometer o seu eleitorado mais jovem
futuro nem a ala empresarial do partido.
Nesse
primeiro choque cultural do ano, venceu o direito à igualdade dos
homossexuais. Os protestos realizados durante toda a semana obrigaram
Indiana a modificar o texto da lei para proibir que se negue
atendimento a qualquer pessoa nos comércios. “A mensagem é clara.
Nossos negócios estão abertos. Damos as boas-vindas a todo mundo.
Não discriminamos ninguém”, afirmou o porta-voz da Assembleia do
Estado, Brian Bosma.
Cientes
do risco de perder eleitores por essas posições mais conservadoras,
o grupo de jovens Log Cabin Republicans comemorou as mudanças na
legislação. “Era ampla e vaga demais e convidava todo mundo a
acreditar que o Estado te defenderia se você fosse acusado de
discriminação”, disse seu diretor, Gregory Angelo. “Agora sim
está claro que a liberdade religiosa e os direitos da comunidade
LGBT podem conviver”.
O
primeiro sinal de desconexão entre os políticos mais conservadores
e o restante da sociedade aconteceu no domingo passado. Um jornalista
perguntou ao governador de Indiana, Mike Pence, se sua nova lei dava
permissão para discriminar. Sua reação foi uma gagueira de vários
dias. Na quinta-feira, Pence atribuiu a firme reação da população
a uma “confusão” criada pelos veículos de comunicação.
"A
lei representa uma limitação ao que o Governo Federal pode dizer e
o que não pode”, afirma Montserrat Alvarado, diretora de operações
da fundação Becket Fund, especializada na interseção entre
liberdade religiosa e os direitos das minorias.
A
rejeição e a reação quase coordenada de dezenas de organizações
revelam uma mudança de mentalidade impensável há apenas cinco
anos. “Ao ter que falar de discriminação, eles perderam a
iniciativa nesse debate”, afirma Sally Steenland. A especialista
define a reação da sociedade e dos líderes empresariais como uma
“bofetada” nos republicanos. “O que os surpreendeu foi a força
e a altura que alcançou a rejeição em todo o país”.
A
aprovação das leis em Indiana e Arkansas funcionou como um sinal
vermelho para os republicanos. O governador de Indiana, Mike Pence,
levou apenas uma semana para propor uma emenda para impedir a
discriminação por motivos de orientação sexual. Seu homólogo de
Arkansas, que havia copiado o texto em um projeto similar, anunciou
que não vai sancionar a lei. E na Georgia, o próximo Estado da
lista, a votação foi cancelada.
Para
a União Americana pelos Direitos Civis, a volta atrás “representa
uma mudança drástica” na forma como os EUA tratam a discriminação
em nome da religião. “Indiana cometeu um erro terrível e perigoso
e enfrentou uma condenação que vai prejudicar sua reputação e sua
economia”. Esse foi o mesmo argumento de cinco ex-prefeitos de
Indianápolis, que exigiram em uma carta a correção imediata da lei
para evitar “consequências indesejadas”.
A
avalanche de protestos, e a conseguinte retificação, pode ter
ocorrido a tempo de evitar que essa polêmicas e torne um problema
para a campanha presidencial republicana. O partido conservador
enfrenta o desafio de convencer um eleitorado cada vez mais jovem,
mais diverso e mais aberto aos avanços sociais do que nunca antes
nos EUA.
Fonte: http://www.brasil.elpais.com/
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