quinta-feira, 30 de abril de 2015

Supremo dos EUA se divide diante do direito ao casamento igualitário

O movimento a favor da igualdade para gays e lésbicas esperou mais de uma década para ver um caso que avançar até a sala de audiências da Suprema Corte dos EUA e obrigasse os juízes a responderem à pergunta “O direito ao matrimônio deve incluir os homossexuais?”. Aconteceu finalmente nesta terça-feira, e os nove juízes se mostraram profundamente divididos frente ao reconhecimento do casamento igualitário como um direito ao qual todos os cidadãos têm acesso.
Num caso que despertou o máximo de expectativa no país todo, os nove magistrados podem determinar o fim do último movimento pelos direitos civis, o da igualdade dos homossexuais. O Supremo analisou nesta terça-feira as perguntas formuladas por 12 casais que movem ação contra os Estados de Michigan, Ohio, Kentucky e Tennessee por lhes proibirem o casamento, o que consideram uma violação de seu direito à igualdade, e por não reconhecerem o matrimônio de quem já tinha se casado em outros Estados.
As divergências entre os juízes incluem a definição de matrimônio, os interesses que devem ser protegidos pelo Governo e o papel dos Estados na decisão sobre quem pode se casar e quem não pode. O juiz John Roberts, presidente da Corte, transmitiu aos demandantes sua preocupação por “mudar uma definição que nos acompanha há milênios”. Em resposta, a juíza Ruth Ginsburg, da ala progressista do Tribunal, defendeu que “a ideia de matrimônio já não é a mesma de antes”.
O juiz Stephen Breyer acrescentou que ao estender o direito ao casamento aos homossexuais, o poder federal estaria impondo a definição de uma minoria à maioria dos cidadãos. O defensor das proibições impostas pelos quatro Estados aceitou o desafio e pediu aos magistrados “que não interrompam o diálogo” com uma sentença que imponha uma “mudança social de tal magnitude”.
O juiz Antonin Scalia, um dos mais conservadores, declarou que a questão não é se existe o direito ao matrimônio, e sim quem deve defini-lo, os Estados ou o Governo Federal. Breyer acrescentou que “um grupo de cidadão está pedindo aos Estados que façam algo que não querem fazer”, ao obrigá-los a legislar em favor do casamento igualitário. A advogada dos demandantes, Mary Bonuato, argumentou então que no caso Loving versus Virginia, que em 1967 aboliu a proibição de matrimônio de casais inter-raciais, a maioria dos norte-americanos teria votado contra, mas o interesse da Corte não está em acompanhar a maioria, e sim em defender a igualdade para todos os cidadãos.
Os defensores da proibição ao matrimônio igualitário alegaram que as leis estaduais e federais sempre respaldaram o casamento por ele ser uma garantia de reprodução e que um de seus objetivos é a proteção dos menores e de seu vínculo legal com os pais. Os juízes mais liberais da Corte rejeitaram esse argumento, assegurando que nenhum Estado poderia negar legalmente o matrimônio de uma pessoa que não possa ou não queira ter filhos.
O direito ao matrimônio faz parte da nossa Constituição”, afirmou a juíza Sonia Sotomayor ao explicar que se a lei não pode excluir casais inter-raciais nem os que não podem ter filhos biológicos, “o que justifica a exclusão dos homossexuais?”. O advogado de defesa dos Estados disse então que a definição de matrimônio entendida pela maioria da sociedade continua a ser a de um homem e uma mulher. Em resposta, o juiz Breyer formulou uma das perguntas que nenhum dos defensores da restrição do casamento soube responder: “Se o propósito do matrimônio é proteger o vínculo entre os menores e seus pais, não deveríamos incluir também os filhos de casais homossexuais, como já protegemos os adotados?”.
Alinhados com a proposição de Sotomayor, os demandantes argumentam que ao ser negado seu direito ao casamento ou ao ser anulado seu matrimônio, tanto eles quanto seus filhos estão sendo discriminados, pela falta de proteção e de benefícios desfrutados por outros cidadãos. Nesse ponto, os 12 casais contam com o apoio do Governo. O advogado-geral Donald Verrilli comparou as leis que proíbem o casamento entre pessoas do mesmo sexo às leis da segregação racial, já que separam um grupo de cidadãos. “Por que desejaríamos manter essa história?”, perguntou retoricamente aos juízes. “Num mundo no qual os casais homossexuais participam plenamente da sociedade, é impossível defender que lhes neguemos a igualdade de direitos. Merecem, já.”
Roberts também ecoou a preocupação dos que alegam que uma sentença que legalize o casamento igualitário no nível federal eliminará o atual debate presente na sociedade. Scalia, por sua vez, alegou que o Supremo não tem a competência e que os EUA “devem esperar para ver” como o debate se desenvolve. “Esperar nunca serviu para justificar a desigualdade para um grupo de cidadãos”, respondeu Bonuato. O juiz Anthony Kennedy, que pode ter em suas mãos o voto decisivo, reconheceu sua preocupação na exclusão de casais gays e de seus filhos de uma instituição “nobre e sagrada”.
A importância do caso fez com que a Corte concedesse tempo fora do normal para a audiência, de duas horas e meia de duração. O Supremo expedirá a sentença em junho, apenas dois anos depois de revogar a lei federal que definia o matrimônio como a união entre um homem e uma mulher. O movimento pelos direitos dos homossexuais ganhou com aquela decisão, no caso Windsor, um impulso que consolidou a legalização do matrimônio igualitário em 36 Estados e na capital, no Distrito de Colúmbia. A avalanche de mudança coincide, além disso, com amplo apoio por parte da sociedade.
O juiz Kennedy pode fazer a balança pender, mais uma vez, para o lado da igualdade da comunidade LGBT nos EUA. Em 2013 o juiz foi essencial ao se alinhar com a ala progressista, declarando inconstitucional a lei DOMA, que estabelecia a definição do matrimônio, no nível federal, como a união entre um homem e uma mulher. Aquela sentença não reconheceu o direito dos homossexuais se casarem. Os juízes se manifestarão a esse respeito dentro de dois meses, quando o futuro do casamento igualitário nos EUA poderá mudar de uma forma que não podia ser prevista apenas cinco anos atrás.


Fonte: http://brasil.elpais.com/

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